Zaha Hadid, a mulher com o nome mais importante no mundo da arquitetura atual quebrou muitos paradigmas até chegar ao topo

Nasceu em 1950 e cresceu em Bagdá, envolta por uma sociedade religiosa sunita que ainda reprime alguns dos direitos femininos mais básicos. Conseguiu destacar-se no mundo da arte contemporânea cursando sua primeira faculdade em Beirute, o que seria normal se ela não tivesse escolhido a Matemática para graduar-se. E mesmo sendo requisitada pela mídia e por grandes nomes da moda do mundo todo, ela aparecia nos eventos vestida de um jeitão simples, sem luxo e até meio desgrenhado. Esta era Zaha Hadid, uma mulher autêntica, destemida na sua genialidade, que produzia edificações e objetos dentro do conceito chamado de desconstrutivista.

Ainda jovem, aos 22 anos e após terminar a faculdade de Matemática, ela decidiu se mudar para Londres e estudar na Architectural Association School of Architecture. Lá, destacou-se entre os colegas de turma e foi convidada pelo professor Rem Koolhaas a associar-se ao seu escritório – o OMA. Zaha trabalhou alguns anos como arquiteta deste grupo até fundar seu próprio stúdio na década de 1980. Koolhaas parece mesmo ter o faro para recrutar alunos geniais, pois outros grandes nomes da arquitetura, como o dinamarquês BIG e os holandeses do MVRDV – também foram seus alunos e funcionários.

O início da carreira solo de Zaha foi particularmente difícil. Ela não conseguia ver seus projetos realizados, mesmo vencendo diversos concursos, pois as formas eram consideradas avant-garde demais, inviáveis financeira e tecnologicamente. Desanimada, mas destemida, ela passou a dar aulas na mesma faculdade onde se formou para garantir uma renda e continuou participando de concursos arquitetônicos, realizando um laboratório, onde continuou a aprimorar seu talento excepcional na criação de uma linguagem inédita.

O desconstrutivismo, ramo da arquitetura em que se enquadra a obra de Zaha e outros nomes, como Frank Gehry, Daniel Libeskind e o mestre Koolhaas, é caracterizado pela aplicação ousada das formas distorcidas, fragmentadas, que juntas produzem efeitos inéditos dentro de um caos controlado. Evitava o modernismo retilíneo que prega “forma é função” a fim de evitar exageros. O desconstrutivismo extrapola este mantra, exagerando na estética do edifício como um item importante. Zaha Hadid usava ângulos inesperados, superfícies justapostas, novas geometrias que transformavam o edifício quase em uma escultura gigante, dotada de seu próprio mérito artístico de impacto, ultrapassando a função básica a que se destina.

O grande salto na carreira da arquiteta ocorreu na década de 90, quando, gradualmente, foram construídas algumas obras vencedoras de concursos, como a Vitra Fire Station, o LF One, a Zona da Mente, no Domo do Milênio, e o Centro Rosenthal de Arte Contemporânea, em Cincinnati. Isto foi possível graças à adequação das propostas, com as técnicas construtivas que se modernizaram neste período. Projetos que ficaram engavetados tiveram seu período de maturação, provando que as ideias de Zaha muitas vezes estavam à frente do seu tempo.

Desde então, sua carreira profissional extrapolou o mundo da arquitetura. Foi contratada para desenvolver produtos para ícones da moda, como Louis Vutton, Lacoste, Chanel e até para a brasileira Melissa. Em 2004, se tornou a primeira e única mulher, até hoje, a receber o Prêmio Pritzker, considerado o Nobel da arquitetura.

Não é de estranhar que um dos arquitetos cujo trabalho a Sra. Hadid admirava seja outro vencedor do Pritzker, um nome bastante conhecido por aqui – Oscar Niemeyer. Cada um à sua maneira e dentro de seu tempo, eles compartilhavam um certo destemor em seu trabalho, não se preocupando com as críticas que apareciam inevitavelmente, após a proposição dos respectivos vocábulos de formas tão ousadas.

Zaha continou ganhando concursos e cada novo projeto parecia ser mais audacioso que o outro, como, por exemplo, o plano-piloto para a recuperação de uma área modernista de Belgrado, o Beko Masterplan; ou o projeto residencial 520 West, na Rua 28, em Nova York, com estrutura metálica em zigue-zague e grandes superfícies de vidro. Pode ser que a técnica de hoje ainda não esteja preparada para todos os projetos que saiam da mente de Zaha Hadid, mas em algum tempo estará, viabilizando, com um certo atraso, suas proposições visionárias.

Arquiteta Francine Trevisan – www.francinetrevisan.com.br